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Com o slogan “Ouvrons grand les Jeux” (Jogos para Todos), Paris-2024 contou com 206 países participantes e 10.714 competidores - incluindo os Atletas Individuais Neutros (AIN) e os esportistas da Equipe Olímpica de Refugiados (EOR). Os 329 eventos distribuídos por 32 esportes ocorreram na capital sa, principal anfitriã, em 16 outras cidades espalhadas pela França Metropolitana, e numa subsede no Taiti, país ultramarino na Polinésia sa.
Este momento mágico em que tantos povos se encontram com um mesmo objetivo vai muito além das competições esportivas em si, pois revela a complexidade do mundo em que vivemos e expõe as inúmeras diferenças sob o olhar atento de todo o planeta. Diversas questões foram colocadas à prova, como nacionalismos, globalismos, diásporas, laços entre Colônias e Metrópoles, alinhamentos, parcerias, mágoas, ressentimentos, traições, interesses e disparidades econômicas, políticas públicas e de defesa dos direitos humanos, preocupações ambientais e de segurança internacional, terrorismo, violência de gênero, intolerância religiosa, perseguição a minorias, entre tantos outros.
Por si só, a descentralização da cerimônia de abertura já demonstrou isso. Considerada como a mais ousada em todos os tempos por ter sido realizada fora de uma arena esportiva, a solenidade simultânea no Jardins du Trocadéro e às margens do Rio Sena, com a pira olímpica em forma de um balão sendo acesa no Jardin des Tuileries, foi vista como lindíssima para uns, caótica para outros e longa demais para a grande maioria. Realizada sob uma chuva torrencial que afastou o público real e pareceu agradável somente para quem assistiu pela televisão, a cerimônia de abertura, que é o momento em que o país-sede se apresenta ao mundo, reafirmou os históricos valores ses de igualdade, fraternidade e liberdade, e atualizou sua missão ao trazer conceitos como sororidade, diversidade e inclusão.
Era evidente que esse upgrade civilizatório não aria despercebido e, por questões de pura ignorância e de desconhecimento histórico sobre o conceito pagão dos Jogos
Olímpicos, algumas apresentações foram alvo de irados discursos de ódio de fundamentalistas religiosos e de movimentos políticos ligados à Extrema Direita. Nem bem havia acabado a solenidade e as redes sociais já estavam inundadas por conteúdos que não se conformaram com o multiculturalismo apresentado, a presença de imigrantes no lugar de ses, e drag queens e pessoas com orientação LGBTQIAPN+ sendo celebradas no maior palco do mundo naquele momento. Até mesmo os atletas de altíssimo nível e ícones de edições adas dos Jogos Olímpicos que levaram à chama olímpica pelo Rio Sena foram criticados por serem estrangeiros, como Carl Lewis, Rafael Nadal, Nadia Comaneci e Serena Williams.
Ignorantes e mal-intencionados confundiram e manipularam símbolos pagãos e obras artísticas clássicas com uma iconografia religiosa a fim de reforçar seus posicionamentos retrógrados. Houve polêmica se a apresentação da norte-americana Lady Gaga foi ao vivo ou pré-gravada e protestos contra artistas não vistos como ses genuínos. Última apresentação artística do evento e a mais aguardada de todas, a canadense Céline Dion, afastada da cena musical por graves problemas de saúde, parece ter sido a única a conseguir ser uma unanimidade e ar ilesa a tantas críticas. Irrepreensível, da Torre Eiffel, soltou sua voz para o mundo cantando “Hymne A L'Amour”, imortalizada por Édith Piaf, a maior de todas as cantoras sas.
A audiência local e planetária questionou a participação de Israel em meio à guerra que trava contra o Hamas e a delegação israelense chegou a ser alvo de vaias e de protestos do público pró-Palestina, principalmente nos jogos da seleção sub-23 no futebol masculino e na cerimônia de abertura. A participação de Israel soou também como uma contradição à suspensão da Rússia e da Bielorrússia por violarem a Trégua Olímpica devido à invasão e ao conflito na Ucrânia. Com as suas delegações banidas, atletas russos e bielorrussos só puderam competir como "Atletas Individuais Neutros" (AIN), sem identificação nacional e desde que não fizessem qualquer manifestação de apoio à guerra. Invisibilizados, não foram considerados como uma delegação durante a cerimônia de abertura e nem apareceram no quadro de medalhas.
Os Jogos Olímpicos também marcaram o retorno da Coreia do Norte, que havia sido suspensa nos Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 após a desistência de participar em Tokyo-2020, por causa de temores com a pandemia de Covid-19.
Como forma de protesto contra os próprios ses, os atletas da Argélia, ainda em meio à solenidade de abertura, lançaram rosas vermelhas no Rio Sena durante o desfile das delegações. A manifestação foi uma homenagem aos milhares de argelinos mortos durante a sangrenta Guerra de Independência Argelina contra o domínio francês e àqueles que tiveram seus corpos lançados no mesmo rio em um dos ataques em Paris no ano de 1961.
Num momento que lança seu olhar para o futuro, não se sabe ainda se Paris-2024 cumpriu a promessa de ser a primeira edição dos Jogos a ser 100% sustentável e se conseguiu reduzir a produção de carbono pela metade, de acordo com a Agenda Olímpica 2020+5 e o Acordo de Paris. Mas o que se viu foi que a sonhada despoluição do Rio Sena fracassou e foi criticada por atletas e delegações estrangeiras, após diversas competições terem sido adiadas e surgirem casos de adoecimento de esportistas.
Enfim, em Paris-2024, como em todos as outras edições olímpicas, o que aconteceu fora das competições continua a fazer parte do incrível jogo geopolítico que é disputado todos os dias e será atualizado em Los Angeles, daqui a quatro anos.
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